
Sala de aula do futuro: o que é e como implementá-la
A sala de aula do futuro é um conceito que pretende transformar a aprendizagem, de forma que as competências desenvolvidas em sala possam agregar valor aos alunos e à sociedade no futuro. Essa mudança é, sobretudo, impulsionada pelos avanços tecnológicos e também pelos desafios sociais e ambientais que temos pela frente.
Alguns exemplos disso são o tratamento de resíduos, como o plástico, a escassez de recursos essenciais, como a água, e as grandes mudanças nos postos de trabalho, cada vez mais atrelados à tecnologia.
A Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom) prevê que até o ano de 2024, o Brasil vai precisar de 421 mil profissionais de Tecnologia da Informação (TI). Justamente por isso, muitas escolas tomaram a decisão de incluir o estudo da programação no currículo escolar.
Um relatório do Google apontou que 82% dos professores nos Estados Unidos acham que o uso da tecnologia prepara melhor os alunos para o mercado de trabalho.
Apesar de ser uma necessidade, pensar a aprendizagem para o futuro pode ser um grande desafio, afinal, nenhum de nós tem a possibilidade de saber exatamente como ele vai ser. Por isso, fomos buscar estudiosos brasileiros da educação para refletir conosco e, quem sabe, te inspirar a transformar a educação na sua escola. Confira!
A influência da transformação cultural
O mundo parece mudar cada vez mais rápido, não é mesmo? Isso acontece pois a impermanência é uma característica que está ainda mais acentuada em nosso tempo. O que implica em movimentos culturais vigentes por períodos cada vez mais curtos, trazendo essa sensação de que as coisas não permanecem iguais por muito tempo
Um exemplo disso é o material didático nas escolas. Não apenas o seu conteúdo muda de tempos em tempos, mas também a forma como ele é entregue vem sofrendo alterações. Se há cinco anos o material, em seu formato físico, tinha muito valor, hoje podemos observar que a maioria dos estudantes não vê sentido em carregar mochilas pesadas sendo que todo esse peso poderia ser transposto para dispositivos digitais.
Outro exemplo é o café. O lançamento das máquinas com cápsulas prontas da bebida foi um estouro, mas pouco tempo depois muitos questionaram a sua viabilidade. Afinal, se não conseguimos mais lidar com os resíduos que produzimos, por que substituir a forma que fazemos nosso café por outra que gera ainda mais lixo?
A partir disso, uma nova mudança no mercado aconteceu, e muitas das pessoas que antes almejavam este produto deixaram de desejá-lo.
Mas como esse traço influencia na sala de aula do futuro?
Para Alexandre Sayad, jornalista e educador, diretor da ZeitGeist e co-chairman internacional da UNESCO MIL Alliance, "a transformação na escola é mais cultural do que nunca". Isto é, para ele, há uma grande importância da comunidade escolar estar preparada para lidar com a impermanência da sociedade. Nesse sentido, o desafio dos gestores e educadores, nessa nova organização, é preservar o tradicional, representado pela educação, sem perder a conexão com a cibercultura e a cultura dos alunos, representantes do novo.
Tecnologias emergentes na sala de aula do futuro
A seguir, veja como inovações como inteligência artificial, realidade aumentada, realidade virtual, Internet das Coisas e aprendizagem adaptativa estão remodelando o ambiente educacional:
Inteligência Artificial (IA) e Aprendizagem Adaptativa
Ferramentas de IA permitem personalizar o aprendizado de cada aluno com base em seus ritmos, dúvidas e desempenho. Recentemente, a Arco Educação anunciou parceira com a OpenAI para usar o GPT-4 para melhorar ensino e aprendizagem no Brasil.
Sistemas de aprendizagem adaptativa oferecem feedback instantâneo, monitoram progresso e ajustam conteúdos conforme necessidades do estudante. Professoras e gestores têm à disposição tutores inteligentes para revisão automatizada, relatórios de desempenho e rastreamento individualizado.
Três de cada quatro alunos admitem usar IA nos seus deveres de casa, com mais de dois terços deles não considerando o uso como trapaça. Com isso, a OpenAI anunciou em julho de 2025 o Modo Estudo que transforma o ChatGPT em professor que busca levar o aluno até a resposta em vez de dar a solução de primeira.
Realidade Aumentada (AR) e Realidade Virtual (VR)
AR insere camadas de conteúdo digital sobre o ambiente real, enriquecendo a experiência com visualizações tridimensionais de conceitos abstratos. Já a VR transporta os alunos a cenários completamente imersivos, desde explorar o sistema solar até entrar dentro de obras de arte ou corpos humanos.
Internet das Coisas (IoT)
Sensores conectados automáticos monitoram presença, temperatura, luz e nível de engajamento dos alunos, promovendo um ambiente mais confortável e seguro. Lousas interativas conectadas permitem interação simultânea e integrada entre professor e alunos. Com isso, tarefas de rotina são automatizadas, liberando tempo para o professor focar no ensino.
Robótica Educacional
Projetos de robótica ensinam tecnologia, programação, lógica e trabalho em equipe. O uso de kits como Arduino, Lego Mindstorms ou estruturas de hardware livre estimula a resolução de problemas reais de forma interdisciplinar. Essa abordagem transforma o aluno em protagonista do aprendizado.
Maestria de conteúdo
Gil Giardelli, professor global, membro da WFF e da World Future Society, ressalta outro aspecto do momento presente que é o fim da era da informação. O que significa que conhecer algo não é mais um diferencial porque os conteúdos estão disponíveis para todos que desejam consultá-los.
Um exemplo de como essa característica reflete na escola é que hoje os alunos chegam muito mais preparados na sala de aula, pois eles aprendem enquanto jogam e quando assistem a conteúdos nas plataformas digitais. Por isso, Gil acredita que "é um equívoco dar aula. Na verdade, a gente precisa ser o grande maestro desse excesso de conteúdo que o mundo tem."
Os pilares da sala de aula do futuro
Por meio dessas reflexões é possível perceber a urgência de se pensar a sala de aula do futuro agora. Mas, por onde começar? E quais características não podem faltar?
Autonomia e protagonismo
Quase uma unanimidade dentre os estudiosos é a importância de tornar o aluno protagonista do aprendizado - isto é, oferecer autonomia e estimular a busca por informações. Mildren Lopes, co-fundadora da Comunidade Maria Peregrina conta como desenvolve esse protagonismo na instituição: "a escola trabalha com pedagogia de projetos, sendo o aluno quem escolhe o que vai pesquisar, e todo o currículo que precisa ser cumprido passa a fazer parte do projeto definido pelo estudante".
Desenvolvimento socioemocional
Outro aspecto que não pode faltar é o desenvolvimento socioemocional sendo, inclusive, uma das mudanças estabelecidas na BNCC (Base Nacional Comum Curricular). Isabela Villas Boas, sócia e diretora da Troika, startup que desenvolve produtos e projetos customizados para escolas, explica a importância dessa competência:
"Com o avanço da neurociência, nós descobrimos que as emoções e as cognições estão intrinsecamente ligadas. Então, um trabalho com as competências socioemocionais pode levar a um maior sucesso nas aprendizagens escolares."
Raul Spitz, consultor pedagógico do Laboratório Inteligência de Vida (LIV), indica que a escola busque por conteúdos pedagógicos para embasar o trabalho com o socioemocional. "A gente tem que respeitar a faixa etária do aluno. Para trabalhar com uma criança de três anos é preciso usar uma comunicação e lançar mão de uma perspectiva pedagógica completamente diferente de quando trabalhamos com jovens de treze anos", exemplifica.
Mas, como o gestor pode preparar a sua instituição para as mudanças na sala de aula?
Por onde começar?
Ericsson Senno, gestor acadêmico da escola Luminova, compartilha o que acredita ser o ponto de partida: “Quando nós pensamos em uma escola inovadora, certamente precisamos pensar no desenvolvimento das pessoas que fazem parte da instituição”. Nesse sentido, a formação continuada e a capacitação dos professores é essencial para que eles possam transformar a sala de aula.
Conversar, desenvolver em conjunto e preparar a equipe para as mudanças pode contribuir para uma menor resistência ao novo e também trazer uma maior confiança para os profissionais da escola.
Ericka Vitta, diretora do Núcleo de Educação Integrada da Fundação Romi de Santa Bárbara d'Oeste, uma escola atenta às tendências mundiais e referência em inovação, lembra a importância de também incluir os alunos e responsáveis nesses processos de transição.
E para ela, a melhor forma de fazer isso é ouvindo. Principalmente quando as coisas precisam mudar muito rápido, como aconteceu quando o ensino remoto emergencial foi necessário. "Ouvimos os alunos, os professores e as famílias e essa ideia de ouvir como estava sendo o processo foi fundamental para irmos lapidando o ensino. E isso deu muito certo," complementa.
Na sua escola você tem ouvido os anseios da comunidade escolar? Para fazer isso é essencial ter uma boa comunicação.
Nesse sentido, como está a comunicação na sua escola? Ela afasta ou aproxima os responsáveis?